Espaço cultural mineiro de Hip Hop intensifica atividades após premiação do MDHC

Quando entrou para a cena do Hip Hop ainda em 1997, o Tiu Blitz – como Junio Marques é conhecido – já sabia da falta de espaços culturais que pensassem a partir dessas referências. A Casa do Hip Hop Taquaril – um dos projetos vencedores do Prêmio Cidadania na Periferia, promovido pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) – nasceu exatamente dessa demanda.
MC, fundador e idealizador do espaço, Blitz conta que ele e outros colegas da cultura Hip Hop conviveram com artistas de diversas gerações que contavam sobre lugares próprios para a reunião de pessoas da cena em outros estados, onde ocorriam seminários, congressos, debates e palestras. Minas Gerais, no entanto, carecia de um local como esse, o que tornava a cena “separada”.
“Até então, cada um dos grupos que tinha aqui fazia o seu trabalho individualmente, não era coletivo. Eu vi nisso uma oportunidade de juntar todo mundo e convidei um integrante de cada grupo de Hip Hop da comunidade para ser colaborador, coordenador do espaço junto com a gente”, relata Blitz. Depois disso, ele e outros colegas chegavam no salão e imaginavam as possibilidades de aproveitamento do espaço como sala de cinema, estúdio e biblioteca.
Fundada em outubro de 2016 e com quase 10 anos de existência, a Associação Cultural Casa do Hip Hop Taquaril foi premiada pelo MDHC no eixo “Proteção integral de crianças e adolescentes”.
Cultura acessível
A notícia sobre o Prêmio Cidadania na Periferia chegou à presidência da Casa do Hip Hop Taquaril por meio das redes sociais. Blitz viu a divulgação e percebeu que o trabalho desenvolvido na Associação se encaixava no eixo voltado a projetos de cuidado e formação para crianças e adolescentes, com o incentivo ao cuidado comunitário.
Atual presidente do projeto, Sandro Alves – também vice-coordenador do Fórum de Hip Hop de Belo Horizonte, rapper do Grupo Setor, liderança cultural e educador social – conta que o espaço da Casa é gerido pela própria comunidade do Conjunto Taquaril, localizado na região Leste de Belo Horizonte (MG).
Após anos de funcionamento com recursos próprios, a Associação decidiu buscar apoio para continuar e aprimorar suas atividades. Com a submissão do projeto, o objetivo era melhorar as condições do espaço cultural para atender às necessidades da comunidade, promovendo a cultura Hip Hop como forma de transformação social.
A própria região do Taquaril surgiu em meio à luta por moradia e aos problemas ambientais causados pela mineração na Serra do Curral. “A gente vive no pé da Serra, e quando estão fazendo o processo de extração do minério, tem a questão da poeira, que vem ‘cabuloso’ para dentro das casas das pessoas e atrapalha o ar e o próprio ambiente”, relata.
Além desses episódios envolvendo poluição e desmoronamentos, a comunidade também enfrenta os desafios de acessar serviços públicos e equipamentos de cultura e lazer devido à geografia do local. Sandro conta que os deslocamentos na região são mais complicados que no Centro, por exemplo. “As paradas ficam muito distantes, e aqui a gente tem muito morro, temos que subir muitas ruas e escadas, e a gente sabe que isso impacta na circulação das pessoas dentro da comunidade. Por isso, a gente consegue chegar em lugares que o poder público muitas vezes não chega”, relata.
Novas oportunidades
Para Wilma Coelho, chefe da Assessoria Especial de Educação e Cultura em Direitos Humanos, Meio Ambiente e Empresas (AEDH) do MDHC, a iniciativa, para além de seu propósito de disseminar a cultura do Hip Hop, tornou-se um projeto que promove e potencializa diversas expressões culturais no território e busca incentivar o empreendedorismo na comunidade, atendendo principalmente jovens que, sem o espaço, não teriam acesso a essas oportunidades.
“Isso faz da Casa um espaço de promoção de direitos, cultura e protagonismo da juventude periférica. Projetos como este têm o potencial de ampliar a garantia dos direitos humanos em territórios historicamente esquecidos e que merecem ser, além de reconhecidos, incentivados pelo Governo Federal como meio de atenção às comunidades e suas demandas”, afirma ela.
De acordo com a chefe da AEDH, o Prêmio Cidadania na Periferia é ainda mais relevante quando se considera que projetos culturais com impacto social e educativo possuem a capacidade de promover inclusão social, respeito à diversidade, fortalecimento dos laços da comunidade e a geração de empregos dentro de uma economia criativa da periferia. O projeto, além de oferecer atividades culturais, como oficinas de poesia, grafite, Hip Hop e podcasts, também promove práticas esportivas, como Capoeira e Jiu-Jitsu, além de ações educativas e de incentivo ao empreendedorismo na comunidade.
Transformação social
- O projeto, além de oferecer atividades culturais, também promove práticas esportivas e ações educativas e de incentivo ao empreendedorismo (Foto: Divulgação)
O Rapper W2, vice-presidente da Casa do Hip Hop Taquaril, analisa que a cultura Hip Hop, através da sua arte – que envolve break, grafite, DJ e rap –, aborda questões como racismo, pobreza, violência e desigualdade social, e dá voz e espaço para a comunidade que vivencia todos esses problemas. De acordo com ele, também vocalista do Grupo de Rap Vozes da Periferia BH, coordenador do Fórum de Hip Hop de Belo Horizonte, educador social e liderança comunitária e cultural na região Leste de BH, a comunidade passa a ter acesso a uma cultura que traz informação e conscientização, incentivando a juventude a lutar pelos seus direitos e espaços.
“O Hip Hop, que é para todos, mas é uma criação dos negros, veio dialogar com a juventude negra, fazendo com que ela entenda o seu espaço, a sua importância e lute pelos seus direitos e ideais. Há 50 anos, essa cultura vem causando transformações sociais, lutando pelos direitos humanos, pela vida, pela dignidade, pelo respeito e dando voz aos excluídos”, defende W2.
“Aqueles que não tinham muito contato com o Hip Hop passaram a ter, principalmente através do rap, que é um contato muito direto, uma conversa, muito ‘papo reto’ falando sobre diversos temas que, às vezes, nos era proibido de ser falado entre nós ou que a gente não tinha as informações. O Hip Hop levou isso para dentro de cada quebrada no decorrer de 50 anos no Brasil, pelo mundo afora, causando essas transformações”, complementa W2.
Juventudes da comunidade
O jovem Henri Davi Arcanjo Pereira Domiciano tem 16 anos e experienciou o poder de transformação mencionado por W2. Aluno de capoeira – corda laranja – da Casa do Hip Hop Taquaril e estudante do 2° ano do Ensino Médio, começou a frequentar o espaço quando ainda tinha 12 anos. “Lá, eu pude mudar minha mente e me afastar de coisas erradas. A Casa é superimportante nesse quesito, em ocupar a mente de jovens e crianças, tirar elas do mau caminho e transformá-las em pessoas de bem”, conta.
A mineira Fabiane Samara começou a trajetória dentro da cultura Hip Hop quando tinha entre 16 e 17 anos e começou a frequentar a Casa. “O espaço me acolheu e me ensinou muito. Passei um bom tempo por lá, absorvendo conhecimento, trocando experiências e conhecendo pessoas que, assim como eu, encontraram um caminho de expressão e resistência na arte”, conta.
No espaço, Fabiane se envolveu com o grafite, participando das oficinas ministradas pelo professor Alfa Lucas. Foi ele quem mostrou a ela como enxergar a arte como uma ferramenta de transformação. “Aprendemos sobre respeito, dignidade e, acima de tudo, empatia, algo essencial para quem vem da periferia e entende a luta diária para seguir em frente, criar e manter viva a juventude”, diz.
“Hoje, aos 20 anos, levo comigo tudo que aprendi nesse espaço, seja no meu trabalho como oficineira de grafite, no contato com a juventude, ou nas oportunidades que surgem pelo caminho. A arte me mostrou que é possível sonhar e construir novas realidades e a Casa do Hip Hop foi um dos primeiros lugares que me mostrou isso”, complementa.
Melhorias em andamento
- Já foram repostos e consertados aparelhos de som e equipamentos que estavam danificados (Foto: Divulgação)
O presidente da Associação destaca que desenvolveu melhorias na estrutura e aumentou as ações de mobilização cultural na comunidade graças ao valor recebido pelo Prêmio Cidadania na Periferia. “O nosso objetivo central é trazer a galera para dentro do espaço e conseguir desenvolver as potências que temos dentro da comunidade, como uma incubadora de talentos”, conta Sandro.
Até o momento, já foram repostos e consertados aparelhos de som e equipamentos que estavam danificados, além de ressarcido parte do trabalho dos oficineiros, que são pessoas do bairro que costumam repassar conhecimentos adquiridos em outros projetos sociais. “O Hip Hop é uma política pública capaz de fazer uma transformação social imensa, se bem trabalhado”, explica.
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Texto: R.O.
Edição: F.T.
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