Adolescência no mundo digital é tema de webinário do MEC

Um diálogo sobre a adolescência e as singularidades dessa etapa do desenvolvimento humano e sua relação com as telas foi tema do webinário “Adolescências no Mundo Digital”, apresentado na quinta-feira, 3 de abril, pelo Ministério da Educação (MEC). O debate entre representantes da pasta e convidados apresentou diversas nuances sobre o tema que interessa tanto para redes de ensino, escolas e professores dos anos finais do ensino fundamental quanto para pesquisadores e famílias dos estudantes adolescentes. O foco do evento foi a ampliação da compreensão sobre a adolescência e a importância de uma educação digital e midiática que lhes possibilite interagir de modo mais saudável com o universo das redes sociais.
Responsável pela condução de políticas públicas como o programa Escola das Adolescências e a estratégia Escolas Conectadas, a secretária de Educação Básica (SEB) do MEC, Kátia Schweickardt, prestigiou o evento e afirmou que o Ministério “redobra a atenção” sobre esse período do desenvolvimento humano, em especial sobre a relação com a tecnologia. “Estamos aqui para estender as mãos a vocês, pois temos uma série de orientações para as escolas sobre o uso racional dos dispositivos eletrônicos”, afirmou. O debate está disponível no YouTube do MEC.
Tanto o programa Escola das Adolescências quanto a Estratégia Nacional Escolas Conectadas são políticas educacionais do MEC que oferecem insumos para a ampliação da qualidade social da oferta educativa dos anos finais do ensino fundamental junto às redes de ensino e às escolas, colaborando com uma estratégia que enfoca os sujeitos da aprendizagem e apoia equipes de secretarias e escolas a organizarem o currículo e a aprendizagem com fortalecimento do acolhimento, da escuta, da cultura digital, da inovação e da participação.
A secretária também abordou a importância de a comunidade escolar contar com a parceria das famílias e da sociedade civil como um todo nesse desafio contemporâneo. “A gente também está fazendo esse convite para que as famílias participem conosco nessa grande empreitada. Vamos apoiar os nossos adolescentes e ajudá-los a fazer desse ambiente virtual, que é uma realidade contemporânea, um ambiente que pode ajudá-los a construir a sua trajetória acadêmica, uma vida boa na sua família e na comunidade”, convidou.
BNCC – As diretorias de Apoio à Gestão Educacional (Dage) e de Políticas e Diretrizes da Educação Integral Básica (DPDI) do MEC acrescentaram ao debate o detalhamento de políticas e a apresentação do entendimento da pasta sobre o tema. A diretora da Dage, Anita Stefani, lembrou que a educação digital e midiática é um componente da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), com a recomendação de ser ensinada de forma transdisciplinar, integrada a outras matérias da educação básica. O objetivo é que os estudantes aprendam a utilizar e criar tecnologias de informação e comunicação de forma crítica e ética. “Esse componente da educação de qualidade é muito importante que seja cada vez mais introduzido e aperfeiçoado no dia a dia dos currículos, nas salas de aula do Brasil”, reforçou a diretora.
“Na escola, os adolescentes podem ter a capacidade de desenvolver as suas competências digitais e, também, uma reflexão mais crítica sobre o uso das tecnologias; sobre como usar, quando usar, por que usar. E, assim, quem sabe garantir um uso mais consciente da tecnologia e de todos os seus artefatos”, completou Stefani. A diretora lembrou, ainda, da legislação em vigor no Brasil, aprovada no início deste ano, que restringe o uso de aparelhos eletrônicos no ambiente escolar. De acordo com a Lei nº 15.100/2025, os dispositivos móveis podem ser usados em atividades educativas, sempre com acompanhamento dos professores, e por estudantes que necessitem de recursos de acessibilidade. Além disso, a BNCC também propõe que educadores usem ferramentas digitais para desenvolver a disciplina de educação midiática e que estudantes desenvolvam fluência no uso da tecnologia digital.
O diretor de Políticas e Diretrizes da Educação Integral Básica do MEC, Alexsandro do Nascimento Santos, convidou os presentes no webinário a um “pacto social” para proteger os adolescentes na relação com a tecnologia, indicando que as escolas não conseguirão conduzir esse debate sozinhas, ainda que recebam as diretrizes de políticas nacionais relacionadas ao tema. “A nossa conversa precisa ser de corresponsabilização, pois apenas um de nós não será capaz de dar conta da magnitude desse desafio”, indicou.
Além dos desafios pedagógicos relacionados ao trato com os dispositivos eletrônicos na escola, que encontra respaldo nas políticas públicas e nos normativos, o diretor apontou para um olhar mais aprofundado sobre o cidadão em formação. “A nossa sociedade também precisa se questionar sobre como a gente quer organizar a relação das adolescências com esse espaço digital, pois, da forma como estamos conduzindo até agora, temos exposto os nossos adolescentes a muitos riscos”, alertou Alexsandro. “As redes sociais, os espaços digitais de convivência, têm sido o principal refúgio das nossas adolescências e, portanto, têm se constituído como um espaço em que eles se formam. Eles aprendem jeitos de ser humano”, completou. O diretor alertou para o fato de essa interação no ambiente virtual ocorrer, em muitos casos, sem a supervisão dos adultos, o que torna a experiência solitária e, algumas vezes, “perigosa”.
Conexão – O webinário “Adolescências no Mundo Digital” também contou com a presença de convidados que agregaram ao debate com suas experiências profissionais. Em sua fala, a juíza titular da Vara da Infância e Juventude do Rio de Janeiro, Vanessa Cavalieri, reiterou o posicionamento do diretor Alexsandro Santos. Ela disse que, ao conversar com adolescentes conduzidos à vara, percebe que muitas violências ocorrem após um longo processo de solidão e abandono. “A violência é uma forma muito equivocada e trágica de expressar necessidades legítimas. Tanto na escola quanto no sistema de justiça, temos percebido a grande invisibilidade que adolescentes têm sofrido”, afirmou Cavalieri.
Segundo a magistrada da maior vara do país em termos de população atingida e competência territorial, adolescentes têm sido “cooptados” diariamente por comunidades extremistas na internet. “Elas [as comunidades] acabam, muitas vezes, fazendo quase uma lavagem cerebral nesses jovens e os convencendo de que o sofrimento deles tem uma solução muito fácil. Para ser resolvido, basta que aquelas pessoas que causam esse sofrimento sejam eliminadas. É uma solução trágica e muito simplista”, alertou.
Cavalieri afirmou que muitos desses adolescentes começam a sofrer um isolamento ainda quando crianças, mas não são devidamente observados. “A necessidade humana mais importante de todas é a de pertencimento e conexão humana, e os adolescentes que chegam até nós não têm essa necessidade atendida. Eles dão sinais, mas está todo mundo muito distraído, inclusive com os próprios telefones celulares. Esse menino, essa menina que é ignorada, vai parar nesse lugar virtual perigoso”, alertou. “A gente precisa mudar esse cenário justamente investindo na conexão e em relações menos adoecidas. A gente precisa resgatar a cooperação, sempre lembrando que é preciso uma aldeia inteira para educar criança”, finalizou a juíza, que também coordena o projeto de prevenção à violência nas escolas “Protocolo Eu Te Vejo”.
O jornalista e coordenador do projeto “O Silêncio dos Homens”, Ismael dos Anjos, acrescentou ao debate pesquisas sobre o tema. Ao contextualizar seu trabalho, defendeu que, assim como não existe uma única adolescência, também não há uma masculinidade hegemônica “que organiza uma noção de homem, no singular, na nossa sociedade”. Além disso, o jornalista afirmou que tem encontrado mudanças no perfil de entrevistados ao longo dos anos. “A gente precisa se preocupar porque a referência de masculinidade está sendo atualizada. Em 2019, sete a cada dez homens miravam o pai como a principal referência de masculinidade. Uma pesquisa que está sendo desenvolvida agora mostra que novos influenciadores entraram nesse panorama”, afirmou.
A pesquisa “O Silêncio dos Homens”, lançada em 2019, contou com mais de 40 mil respostas de todo o país em uma investigação sobre “as principais dores dos homens” e as percepções das mulheres. “Uma coisa que não aparecia em 2019 e já aparece em pesquisa realizada ao longo de 2024 é que influenciadores online já ocupam uma preponderância de 14% em meninos que dizem que essas são as referências de masculinidades deles”, alertou Ismael. A pesquisa recente ouviu mais de 2.500 adolescentes do Brasil, entre 13 e 17 anos.
Para Ismael, é preciso diminuir a “cisão” ainda presente na forma de educar meninas e meninos. Isso porque essa diferenciação ainda provoca uma busca pela validação de comportamentos entre homens e uma dificuldade em expressar sentimentos e pedir ajuda. “Ser vulnerável não é uma opção”, exemplificou. “Os nossos filhos e filhas estão acessando outros universos e, nesse sentido, a gente precisa ter mais repertórios também”, defendeu Ismael. Ainda segundo o pesquisador, apenas cinco em cada dez meninos dizem ter certeza de que são amados pelos pais.
O jornalista defendeu que os pais tenham um papel de “curadores” das informações que chegam aos adolescentes. “A gente precisa escolher que vozes nós estamos amplificando, que conversas que a gente está fazendo ganharem eco e, também, que tipo de filtro a gente está fazendo nesse mundo em que há muita produção de conteúdo. A gente não pode deixar que ele seja convencido a se juntar a um grupo, muitas vezes, masculinista, só porque esse grupo fala mais alto ou usa ferramentas que chegam mais brevemente a esses meninos”, defende. Segundo Ismael, em um contraponto positivo, a pesquisa recente também já aponta para questões relacionadas à saúde mental e comportamental. Entre elas, está o interesse em tratar meninas com respeito e em formas de paquerar, sem assediar.
Guias – O webinário foi finalizado pela integrante da coordenação da Escola das Adolescências, Ananda Carrias, que reforçou as políticas públicas do MEC e indicou a consulta aos cadernos de inovação curricular. Esses materiais, voltados para os anos finais do ensino fundamental, são ancorados em metodologias inovadoras e no protagonismo estudantil.
Acesse aqui os materiais e as orientações sobre os dispositivos digitais.
Assessoria de Comunicação do MEC, com informações da SEB
Fonte: Ministério da Educação